A Lei 15.100/25 restringiu os celulares nas escolas brasileiras. Seja na hora da entrada, no recreio ou na saída, os dispositivos não podem mais estar nas mãos dos estudantes. A não ser em casos excepcionais como os ligados à acessibilidade, situações de perigo, necessidades especiais e motivos de força maior. Além, claro, do uso para fins pedagógicos.
Com ênfase em não usar os celulares no período escolar, pouco vem sendo discutido sobre o que é o bom uso pedagógico do aparelho em sala de aula, o que pode causar confusão para algumas pessoas.
Em linhas gerais, o uso pedagógico do celular na escola se refere à utilização consciente e intencional desse dispositivo como uma ferramenta de ensino para facilitar e enriquecer o processo de ensino-aprendizagem, explica a professora Débora Garofalo, especialista em tecnologias educacionais e colunista do Porvir. “A tecnologia deve ser integrada de forma que promova a interação, a colaboração e a pesquisa, contribuindo para a formação de estudantes críticos e autônomos”, complementa.
A intencionalidade pedagógica deve ser muito clara quando o professor decide usar o aparelho em sala de aula e precisa ir além do acesso aos aplicativos. Para Débora, trata-se de uma oportunidade de promover atividades que incentivam a autoria, a pesquisa e a construção do conhecimento.
“Gosto sempre de ressaltar que a tecnologia, como bem colocada na BNCC (Base Nacional Comum Curricular), é ferramenta de ensino, mas também objeto de conhecimento com habilidades e competências que precisam ser desenvolvidas na educação. Por isso, esse uso não pode ser feito por mera diversão: é importante que haja um objetivo final que enriqueça o processo”, afirma.
Léo Burd, pesquisador do MIT (Massachusetts Institute of Technology) Media Lab, nos Estados Unidos, e presidente do Conselho da RBAC (Rede Brasileira de Aprendizagem Criativa), também destaca que a presença dos celulares nas aulas precisa estar alinhada aos objetivos do planejamento do professor. “Principalmente por ser uma ferramenta tão poderosa, não deve servir para distrair, mas para enriquecer, abrir novos horizontes e aprofundamentos sobre a discussão pedagógica que já vem sendo explorada pelos educadores com seus alunos”, ressalta.
A política instituída pelo governo federal em janeiro tem causado menos divisão em termos de apoio do que outras situações que ocorrem dentro e fora da escola. Em comentários e postagens nas redes sociais, e também nas comunidades de educadores do Porvir no WhatsApp, professores relatam com certa alegria que os recreios voltaram a ser barulhentos e que a atenção dos alunos melhorou. As famílias também comemoram a decisão.
Léo Burd acredita que a medida também se tornou importante porque chama atenção para a maneira como dispositivos móveis aparecem na educação. Para ele, o cenário força uma reflexão mais ampla sobre tecnologia.
“Falamos sempre que os elementos de uma educação mais criativa e mais centrada no estudante não dependem da tecnologia, porque podemos exercitar a criatividade com os materiais mais diversos. Porém, a tecnologia ajuda a ampliar horizontes, cria novas possibilidades, educacionais… Mas deve ser usada de forma adequada”, pontua.
A pesquisa TIC Educação de 2022 mostrou que 75% dos professores do ensino fundamental e médio disseram usar tecnologias digitais com os alunos para realizar aulas expositivas, 72% para solicitar a realização de exercícios e 78% para fazer pesquisas.
“Para realizar estas atividades educacionais, o telefone celular era o dispositivo mencionado em maiores proporções: 67% dos docentes afirmavam utilizar o dispositivo digital durante as aulas com os alunos. Entre os professores que lecionavam em escolas estaduais (76%) e particulares (77%) tais proporções eram ainda maiores – entre os professores de escolas municipais, 49% afirmavam utilizar o telefone celular em atividades com os estudantes”, lembra Daniela Costa, coordenadora da pesquisa TIC Educação, do Cetic.br, entidade responsável pelo levantamento.
Ao mesmo tempo em que os dispositivos móveis possibilitam uma ampliação na forma de ensinar e aprender, há sempre o risco de desvio de atenção. “Um dos problemas é que, quando a gente usa o celular, ele traz também toda uma bagagem de propagandas e outros conteúdos que que tendem a distrair o foco dos estudantes”, afirma Léo.
Aliada à necessidade de formação em competências digitais, outro fator desafiador é a infraestrutura das escolas. “Muitas escolas não têm acesso adequado à internet ou dispositivos para todos os estudantes, o que limita a efetividade do uso pedagógico. Além disso, a resistência de alguns educadores em adotar novas tecnologias, por medo de perder o controle da sala de aula ou pela falta de formação específica, também é um desafio que precisa ser superado”, comenta Débora.
Acima da restrição ou da proibição desses aparelhos, a educadora destaca que é urgente educar para o uso consciente e para a cidadania digital, incluindo no currículo a educação midiática.
O Porvir conversou com Maria da Graça Moreira da Silva, doutora em Educação e coordenadora do Programa de Pós-Graduação em Educação: Currículo da PUC São Paulo, que trouxe sugestões para o uso pedagógico do celular nas escolas levando em consideração a nova lei:
Outro aspecto mencionado pelos especialistas ouvidos pelo Porvir, e reforçado pela nova lei, é a necessidade de formação de professores para as competências digitais.
“Para desenvolver um bom uso pedagógico dos celulares, os professores precisam, primeiro, de formação contínua, ou seja, conhecimento sobre as ferramentas tecnológicas disponíveis e suas aplicações pedagógicas. Essa formação precisa estar relacionada às competências digitais e à BNCC da Computação, envolvendo os pilares do mundo digital, da cultura digital e do pensamento computacional”, diz Débora.
Leo Burd segue na mesma direção, ao afirmar que o estudo vai auxiliar os docentes a fazer um uso adequado do dispositivo na escola. Neste sentido, é possível contar com uma série de ferramentas de apoio para os professores.
O MEC (Ministério da Educação), por exemplo, conta com o Autodiagnóstico de Saberes Digitais Docentes, no qual o educador pode medir suas capacidades e entender em quais pontos precisa melhorar. A RBAC desenvolveu o curso “Monstros em Rede”, em parceria com a Vila Sésamo e Internet Society e TechSoup, focado em auxiliar docentes a terem um uso mais saudável das tecnologias digitais.
A professora Graça Moreira também recomenda que professores e gestores sigam aperfeiçoando suas competências digitais. Abaixo, suas sugestões:
Saiba mais em: https://porvir.org/o-que-e-uso-pedagogico-do-celular/
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